“A nossa roupa reflete muito o nosso estado de espírito e a nossa maneira de ser”

MODA O gosto pela moda surgiu em pequena. Atualmente a tirar o curso de Design de Moda, Mariana Roque pretende continuar a seguir os seus sonhos no mundo do vestuário. Falou com O Almeirinense sobre a sua jornada.

Mariana, como surgiu o gosto pela moda?
O gosto pela moda surgiu desde muito cedo. Desde pequena que sempre fui muito vaidosa e que gostava de me arranjar e calçar os saltos altos da minha mãe. Mas foi nas minhas bonecas que experimentei os meus primeiros modelitos. Gostava muito de brincar com barbies e outras bonecas maiores, trocar-lhes de roupa muitas vezes, por isso, comecei a improvisar com sacos do lixo e guardanapos agrafados. Com as maiores, enrolava-as com echarpes da minha mãe e apenas com duas ou três conseguia fazer infinitas combinações que resultavam em vestidos diferentes. Fazia, tirava foto, desmanchava e fazia novamente um diferente. Essas eram as minhas brincadeiras e penso que foi a partir daí que todo o meu fascínio por este mundo começou.

Gosta mesmo de colocar o dedal e a linha?
Apesar de sempre ter gostado de experimentar novos modelos em 3D, a costura propriamente dita nunca me cativou. Por isso, até ao primeiro ano da faculdade nunca tinha tocado na linha e no dedal. O meu processo criativo começou a focar-se mais nos desenhos, comecei a seguir alguns ilustradores e a seguir as regras da anatomia feminina para criar um “catálogo” com todas as minhas ideias.
Quando pensamos que podemos vir a ser grandes estilistas, pensamos sempre que não iremos precisar de costurar nada. Mas é mentira. Logo no meu primeiro trabalho de faculdade percebi que tinha de aprender o quanto antes, por isso, inscrevi-me numa escola à parte e, agora sim, gosto de colocar a linha, mas é na máquina. Nada à mão. Seguimos processos industriais. Tudo feito a partir de moldes e tudo costurado à máquina. Confesso que nunca usei um dedal.

“(…) se também podemos falhar a fazer o que não gostamos, porquê não arriscar em fazer o que amamos?”

Quem foram as principais influências para seguir este gosto?
Ninguém da minha família ou amigos está relacionado com a Moda. Eu sempre fui muito decidida. Quando terminei o secundário sabia claramente que o meu caminho só podia ser a Moda, coloquei três opções de candidatura: Moda, Moda, Moda. É claro que as pessoas mais próximas de mim se sentiram receosas por não ser uma área com muitas saídas, pelo menos a nível nacional e por ser uma área em que, para se ter sucesso é preciso ser-se realmente bom.
Mas todos sabiam que era aquilo que eu realmente gostava por isso, se também podemos falhar a fazer o que não gostamos, porquê não arriscar em fazer o que amamos?

Licenciou-se em design de moda. Como correu o curso?
Falta-me um ano para concluir a minha licenciatura. O curso tem estado a correr bem mas não posso esconder que não correspondeu às minhas expetativas. Esperava ter aprendido e experimentado muito mais do que aprendi até agora. Esperava que fosse algo mais sério e mais transformador. Também o facto da pandemia nos ter posto a ter aulas online
num curso em que quase todas as cadeiras são práticas, não ajudou, mas tenho aprendido muito sozinha e estou cada vez mais apaixonada por esta área.

“(…) alguém que vale a pena ter por perto e que não devemos deixar nunca que nos convençam que os nossos sonhos são grandes demais.”

Quais os principais ensinamentos nestes anos?
Os principais ensinamentos destes anos foram que nós conseguimos fazer muito mais do que imaginamos, que as nossas capacidades não têm limites, que quem nos motiva a ser melhores é alguém que vale a pena ter por perto e que não devemos deixar nunca que nos convençam que os nossos sonhos são grandes demais.

E como surgiu este desafio de ir para Itália e o que vai fazer concretamente?
O desafio de ir para Itália surgiu assim muito de repente. Nunca tinha pensado nisso antes mas, o facto de não estar completamente satisfeita com o ensino na minha faculdade, achei que seria bom para mim fazer Erasmus. E é exatamente isso que vou fazer, o primeiro semestre do meu terceiro ano em Milão, a capital da Moda.
As minhas expectativas estão bastante altas, acho que vai ser uma experiencia bastante enriquecedora a vários níveis e espero vir de lá melhor preparada para uma futura carreira com designer.

É a Mariana que ajuda os amigos e família com conselhos?
É claro que agora, mais que nunca, reparo no que as pessoas vestem e como se vestem e gosto de “criticar” no bom sentido. As minhas amigas também gostam de me enviar fotos para as ajudar a escolher a roupa quando vão sair, e às vezes, também preparo uns conjuntos mais arrojados para a minha irmã. Não é sempre, porque todos sabem que o meu gosto é extravagante para o dia-a-dia e nem toda a gente gosta disso, mas, eu sou completamente a favor de que devemos sempre arriscar em looks divertidos sem pensarmos se vão olhar para nós ou o que é que vão dizer. Porque o importante é sentirmo-nos bem e bonitas e a verdade é que, quando nos sentimos bonitas, também nos sentimos mais felizes. A nossa roupa reflete muito o nosso estado de espirito e a nossa maneira de ser.

Desde cedo foi a Mariana que escolheu a sua própria roupa?
Em criança era a minha mãe que escolhia a minha roupa claro mas lembro-me que, no infantário, fazia birras porque não queria vestir o bibe. Para mim, não fazia sentido esconder a minha roupa e detestava que toda a gente estivesse igual a mim. Na escola primária, o cenário repetia-se nos dias em que tínhamos educação física e tinha de ir de fato de treino para a escola. Eu detestava, sentia-me feia e ainda hoje não gosto. A partir do quinto ano, já fui eu que comecei a escolher a minha roupa e o meu gosto foi afinando a partir daí.
Comecei a gostar de me diferenciar e as pessoas iam reparando nisso. Às vezes perguntavam-me: “Onde é a festa hoje?” e eu respondia: “Todos os dias são um bom dia para darmos o nosso melhor”.

Existe a ideia que a roupa vista em desfiles não é roupa para o dia-a-dia. É mesmo assim?
É claro que não é para o dia-a-dia. Existe uma diferença entre moda e vestuário. A moda nós podemos ver nos desfiles. Um desfile é um espetáculo. Um espetáculo onde o designer exibe a sua arte, a sua criatividade. Um desfile não serve para mostrar a roupa que as pessoas devem usar até porque maior parte das peças que se veem nos desfiles não vai para venda. Algumas dessas peças podem ser usadas por celebridades em eventos especiais ou concertos, editoriais para revistas, etc. Apenas as peças que seguem para loja é que podem ser adquiridas por nós. É claro que isto também varia muito de marca para marca. Há marcas mais comerciais que vendem tudo o que passa nos desfiles. Mas essa ideia de que as pessoas têm das peças mais extravagantes realmente não têm esse objetivo mas sim o de dar espetáculo, inovar, criar impacto artístico. Porque Moda é Arte.

Quer um dia participar em grandes desfiles com a marca?
Sim! Isso seria um sonho. Participar nesses desfiles cheios de peças que as pessoas acham que não é para o dia-a-dia. É uma grande responsabilidade mas também uma grande adrenalina. Imagino-me a convidar todas as pessoas que me têm acompanhado neste percurso e a ficarem orgulhosas ao ver, finalmente, o resultado de todo o esforço. Pode ser um objetivo ainda um pouco distante para mim mas é, sem dúvida, algo que quero experienciar.

Ou trabalhar com um grande estilista?
Não tenho nada ainda concretamente definido para mim. Sei que quero experimentar de tudo um pouco, ter o máximo de experiências possíveis na área e depois, sim, decidir qual a mais adequada para mim. Uma dessas experiências tem de passar, claro, por trabalhar com um grande designer. Acho bastante importante sabermos
trabalhar em grupo, partilhar ideias, inspirações e resolver problemas em conjunto. Lidar com diferentes pessoas com pensamentos divergentes dos nossos. Acredito que isso pode oferecer resultados brilhantes e pouco prováveis se apenas pensados por uma só pessoa. Além de todo o conhecimento e experiência que podemos ganhar com alguém que já está na área há bastante mais tempo que nós. Só pode vir a ser uma experiência útil e enriquecedora.

Quem são as influências nacionais e internacionais?
As minhas influências nacionais intensificaram-se, principalmente, quando comecei a assistir aos desfiles da Moda Lisboa. Um desfile presencial tem outro encanto e transmite toda uma outra emoção que não se consegue adquirir através de fotos ou vídeos.
Os designers com quem mais me identifico e que mais me influenciam são o Carlos Gil, o Gonçalo Peixoto, o Luís Carvalho, o Valentim Quaresma e o Ricardo Preto.
Já a nível internacional, tenho um amor incondicional ao Jeremy Scott, o diretor criativo da Moschino. A “vibe” dele é tudo o que eu procuro no meu dia-a-dia, sentido de humor. Aconselho também a pesquisarem sobre alguns dos designers mais recentes que tenho acompanhado como Giambattista Valli, Philipp Plein, Christian Cowan, Thom Browne, Christopher Kane, Pam Hogg e Molly Goddard, valem muito a pena!