Os filhos são um presente generosamente oferecido aos pais e, posteriormente, a toda a sociedade. Trazem a reboque a necessidade de que alguém cuide deles continuadamente até que se tornem autónomos, e não vêm munidos de qualquer botão que possibilite “desligar” essa responsabilidade, nem trazem acoplado nenhum “manual de instruções”.
A maturidade biológica do feto é atingida no final da gravidez, garantindo que a criança ao nascer consiga respirar e comer. Mas o ser humano é um ser sociável, pelo que requer uma segunda “gestação social”, indispensável para o dotar das competências físicas e psicológicas que lhe conferirão a sua autonomia social, ou seja, a possibilidade de vir a tornar-se um adulto resiliente, integrado e autónomo na sociedade em que irá viver.
Assim, para além dos cuidados físicos básicos de sobrevivência, a criança precisa de aprender a interiorizar as regras sociais e a capacidade de lidar com a frustração. Trata-se de um percurso longo e complexo. As “mágoas” inerentes a esse processo só serão bem toleradas e “perdoadas” se essa aprendizagem decorrer num ambiente de muita tolerância. Por isso, esta “sociabilidade primária” requer uma autoridade de tipo afetivo, impregnada do amor que só a família lhe pode proporcionar, e gerida num equilíbrio entre autoridade/amor. “Mandar” significa “ajudar a crescer”, pelo que alguém tem a necessidade de se resignar ao papel de adulto na educação de cada criança, exercendo autoridade num ambiente repleto de carinho e sem hostilidades indesejáveis, superando o mero estatuto de “amigo ou compincha de brincadeiras”.
Cabe aos pais a responsabilidade de cuidar e educar os seus filhos. A família alargada será uma aliada indispensável, trabalhando em sintonia com os pais e desempenhando um papel complementar nesta árdua e gratificante tarefa.
Mas os pais são seres humanos, não são perfeitos e não recebem formação específica para esse fim. Para além disso, os filhos são todos diferentes e requerem cuidados distintos. Então, os pais devem ter consciência de que vão cometer erros e, com humildade, devem ir corrigindo rotas e estratégias, de acordo com os resultados obtidos.
Foram descritos vários modelos de parentalidade.
Pais autoritários têm maior risco de gerar seres impulsivos, agressivos ou mesmo delinquentes. Pais permissivos arriscam-se a ter filhos que serão “pequenos tiranos”, incapazes de cumprir regras, ou de lidar com as adversidades da vida. Pais negligentes e ausentes podem gerar seres com falta de afeto e com maior risco de futuros problemas de saúde mental. Pais persuasivos ou democráticos, que educam com disciplina e autoridade, sem autoritarismo, constituem o modelo ideal de parentalidade.
De um modo geral, na educação dos seus filhos, os pais devem manifestar uma disponibilidade de qualidade face às solicitações da criança/adolescente, mas não aos seus caprichos. Essa disponibilidade inicia-se no nascimento, consolida-se durante o seu crescimento e não deve ser confundida com invasão da privacidade. Por outro lado, os pais devem controlar os seus filhos com autoridade e regras inflexíveis, sem necessidade de serem autoritários.
Concomitantemente, os pais devem proporcionar aos seus filhos uma autonomia gradual e progressiva, fomentando comportamentos de responsabilidade, autoconfiança e segurança, dotando-os, dessa forma, das competências imprescindíveis ao desempenho de tarefas progressivamente mais complexas, impregnadas de civismo e respeito pelos outros e por si mesmos.
A escola desempenha um papel complementar na sociabilidade progressiva da criança e do adolescente, sob a forma de “sociabilidade secundária”. Trata-se de uma autoridade social composta por regras e ensinamentos capazes de os dotar de competências mais especializadas e dirigidas à sua formação técnica e cívica. A tentativa de imposição de regras sociais individuais na escola, na ausência do amor que envolve a autoridade afetiva existente na família, estará seguramente votada ao insucesso. Por isso, a família deve incutir as regras fundamentais da socialização, estabelecendo os alicerces para que a escola possa dar continuidade a esse processo e possa ainda ocupar-se do ensino científico. Desta forma, as funções da família e da escola complementam-se, num verdadeiro trabalho de equipa e em sintonia de valores.
Todas as crianças, sem exceção, têm o direito a crescer num ambiente seguro e saudável, que lhes permita tornarem-se adultos felizes. Só assim o ser humano pode desenvolver-se como um todo equilibrado, na sua vertente física e psicológica. A mais pequena perturbação desse equilíbrio tende a manifestar-se precocemente no sucesso escolar e/ou sob a forma de alterações comportamentais. Os cuidadores devem estar atentos e devem saber valorizar e orientar cada um destes sinais.
No concelho de Almeirim, as escolas dispõem de um Gabinete de Promoção de Sucesso Escolar, que disponibiliza formação gratuita aos pais, dotando-os de ferramentas que lhes permitem lidar melhor com o seu papel de educadores.
Teresa GIl Martins – Pediatra