Como surgiu a ideia de criar um grupo nas redes sociais?
Quando apareceu a crise ninguém sabia respostas, nem o governo , nem as autoridades, não havia telefones disponíveis, não se sabia onde ir, o que fazer. Apenas se sabia que havia um perigo e que tínhamos de ficar fechados, mas ninguém tinha ainda um contacto. Depois foram então criados mecanismos governamentais, mas no início nem a comunicação divulgava muita coisa. O que víamos na televisão e jornais era sobre Lisboa ou Porto nunca sobre Santarém ou Almeirim, era como se estivéssemos sozinhos e precisávamos estar juntos, precisamos de estar juntos sempre, juntos vencemos.
A ideia de criar um grupo nas redes sociais surgiu da minha preocupação sobre a gravidade desta pandemia e da necessidade de encontrar uma forma rápida de chegar ao maior número de pessoas possíveis e conseguir reunir essas mesmas pessoas num mesmo local, sem ser em contextos profissionais e com os mesmos interesses de partilha de informações e de ajudar nesta crise tão grave que é o covid-19.
Quais os objetivos que pretendia alcançar?
Os objetivos que pretendia era de incentivar um isolamento social voluntário para que ninguém fosse atingido pelo vírus, alertar para os perigos desta grave pandemia, que iria chegar à nossa região e sempre acreditei que juntos poderíamos ajudar-nos uns aos outros com informações sobre como agir, informações de como nos proteger, de como usar máscara ou de como fazer máscaras, de como preencher documentação, como conseguir ligar para um médico ou um especialista, de maneira a ter as respostas às tantas dúvidas que estavam a surgir. Era sobretudo para que todos pudessem ter uma voz amiga de confiança no momento mais complicado, depois seria de apoiar e incentivar a quem estivesse sozinho e desesperado em casa, também animar através de dinâmicas de grupo, mesmo à distância, para que não estivessem nunca sozinhos. De seguida, a ideia era poder criar informações sobre como adquirir alimentos ou medicamentos e unir esforços e sinergias, para que todos conseguissem obter os bens necessários e conseguimos atingir todos esses objetivos através deste grupo de ajuda e cidadania.
Foi também uma forma de ajudar quem precisava?
Esta foi a melhor forma de poder ajudar quem não tinha informações, pois como o Almeirinense sabe, desde Fevereiro que eu já tinha a preocupação sobre este vírus e sabia que chegaria a Portugal e que os órgãos sociais, tal como as autoridades não poderiam chegar a todo o lado ao mesmo tempo, nem poderiam dar respostas a todos ao mesmo tempo. Em localidades pequenas como a nossa seria muito mais importante estarmos unidos e podermos ajudar-nos mutuamente pois temos muitas pessoas de bom coração e também temos muitos profissionais que poderiam ajudar, mesmo à distância, e tudo isso veio a acontecer. Ajudamos muitas e muitas pessoas com questões jurídicas, pedidos de subsídios, problemas escolares, alimentação, medicação e muitas outras coisas.
E de ocupar o tempo, já que o próprio João também não podia trabalhar?
Eu não preciso de ocupação pois com três filhos e vários familiares, pacientes e amigos a quem tentei prestar o máximo de apoio possível, mesmo à distância ou levando material de proteção e alimentos, não me restava nem resta muito tempo livre, mas o sentido de responsabilidade fala sempre mais alto. Se eu pudesse salvar ou ajudar uma vida já seria útil, mas na verdade conseguimos juntos salvar muitas vidas e ajudar muitas vidas.
Além deste grupo que criei, também me alistei no exército, na linha da frente, para poder ajudar e também fiquei como coordenador do SOSVizinho em Almeirim. Por isso, nunca tive tempo livre , tive sim a veia de ribatejano e o coração de pai e de Português que defende sempre a sua pátria, e acredito que juntos somos mais fortes e conseguimos vencer qualquer batalha.
Quais as maiores dificuldades na gestão do grupo?
Bem, esta é uma pergunta difícil, existiram muitas dificuldades. O grupo cresceu muito rápido, em 24 h já eramos milhares, em 48 horas tinha 7000 membros ativos, coisa que eu nunca tinha visto. Tenho grupos e páginas, mas nunca com 7000 pessoas ativas a fazerem perguntas, a pedirem ajuda, a divulgarem informações e telefonarem para mim, a enviarem mensagens 24h por dia… Foi duro, mas valeu a pena. Foram muitos dias sem dormir, a tentar ajudar todos a tentar filtrar informações falsas, a tentar unir pessoas e consegui, consegui que deixasse de ser o meu grupo para passar a ser um grupo de todos, em que todos se ajudavam uns aos outros e esse foi o meu maior feito. Foi que nos tornássemos um grupo em prol de uma causa, foi muito bom, é muito bom, pois o grupo não acabou, esta guerra ainda não acabou e infelizmente acredito que volte em outubro, por isso temos de estar atentos e continuar juntos para um dia podermos festejar com saúde e todos vivos.
Era só o João a gerir?
O grupo foi minha iniciativa, mas após quatro dias tive de solicitar ajuda e tive ajudas fundamentais, mas devido à grande atividade do grupo alguns membros não puderam continuar pois os “alarmes” estavam sempre a disparar, os telefones a tocar, era duro, muito duro. Mas, com ajuda, conseguimos criar dinâmicas de grupo, criar tópicos, dividir horários e tarefas, classificar temas, foi engraçado, mas duro. Mas valeu a pena. A Isabel Figueiredo e o Sérgio Teodósio estiveram no inicio mas depois abandonaram, a minha esposa Marina Silva, o Luís Silva, o Paulo Colaço, o José Alberto Pereira, o Eduardo Tavares Lopes e o Ricardo Casebre ficaram até agora. Embora tenham saído alguns deste nomes como moderadores devido ao grupo neste momento estar tranquilo, mas estas pessoas foram fundamentais neste grupo e muitos de nós trabalhamos em prol do grupo quase 24 horas. Chegou-se a fazer ligação de familiares da região com familiares pelo mundo fora, até crónicas eram feitas e temas para descansar e tranquilizar muitas das pessoas para que o tema não fosse sempre o mesmo, mas muitos dos membros foram ajudando. Tivemos e temos advogados, médicos, políticos, atores e músicos, profissionais da banca e dos seguros, empresários de logística e da restauração que sempre ajudaram diretamente os membros que tinham problemas, dúvidas e necessidades, tivemos e temos membros que ajudavam com documentações às duas e três da manhã.