Pela História escrita e contada pelos antigos, a Quinta-feira de Ascensão foi uma Festa considerada pagã e depois reconvertida para religiosa. Os hábitos dos trabalhadores do campo, em tempos, irem pedir ao Altíssimo para que as colheitas fossem boas, seriam mais tarde compostas com Estandartes, Tochas e com algum Santo (disponível na altura), fazendo daquele dia uma festa popular. O mês de Maio, além de trazer o espírito da Primavera e das flores, foi também, no séc. XIV, em muitos Países, o mês dos casamentos. Sem dúvida que o banho anual era somente efectuado nessa altura. Assim, também os ditos casamentos eram consagrados porque havia limpeza corporal, para além de que era o tal mês fértil. E vai daí… as uniões.
Mais tarde irei explicar o porquê ou a razão disto tudo, noutras crónicas. Dia 30 deste mês, mais uma Quinta-feira de Ascensão, feriado aqui na então Vila desde 1978.
Poderemos desde já recordar que a Quinta-feira de Espiga traduzia pelo seu nome, trazer para casa, um ramo de oliveira, de videira, de cevada ou trigo, com algumas papoilas, fazendo um ramo que se pendurava na Cozinha. Secava e no ano seguinte, conforme a tradição queimava-se e substituia-se pelo que era trazido nesse mesmo dia, mas novo.
De todas estas plantas, Oliveira (o azeite), Espiga de Trigo (o pão) e as Videiras (o vinho), eram divinamente representadas para que o ano fosse do melhoria, em agricultura e a abastância fosse presenteada de forma a não existir fome.
Almeirim, como demais terras, foram sempre convictas e seguidoras destas tradições, apesar de nestes últimos tempos, ir perdendo aos poucos os que os nossos avós nos deixaram. Isto tem muito que se diga. Conclusão: ser Almeirinense nestes tempos modernos é dificil porque antigamente, um Bom Almeirinense levava sempre um “Palhinhas” e a “mánica das pelingrafias” ou o “Kodaqui” para onde quer que fosse, o barrete enfiado com a onça do tabaco lá dentro, o arroz de pato ou galinha no forno, o cão, a carroça e a Velha à Feira da Piedade a Santarém às Festa da Senhora do “Castele” a “Cruche” ou às Festas da Raposa, receber ou ter visitas e mostrar a casa toda nesse dia até “chatiar”, a casa de Jantar ser utilizada ao fim de 2 ou 3 anos ou então se estivesse a comer e as visitas não interessassem, esconder de imediato debaixo da mesa os petiscos e colocar em cima previamente já combinado um bocado de pão com queijo ou “choriça”, dizer mal de tudo e todos mas fora da vila, brigar com tudo e todos se dissessem o contrário, ter dinheiro no bolso e perguntar ao amigo – “Não pagas nada?”, tirar a cera dos ouvidos com a unha comprida do dedo mindinho e limpar às calças ou às cortinas da Sala que por acaso não gostava nada porque tinha sido dado pela sogra, tirar “saguins” do nariz e colocá-los na parede da vizinha por sacanice, ir de vez em quando à vizinha que sabia ver o mau olhado ou o quebrante para fazer umas benzeduras com azeite e “áuga”, lavar a carroça e burro tudo ao mesmo tempo, falar mal do governo de cá mas foi ele que contribuiu para o ter, ir beber um copito à taberna apesar de ter vinho em casa, não gostar mesmo de ciganos, ser católico e ir só à Igreja em casamentos e batizados e obrigar os filhos a terem de ir à catequese, quando tinha dinheiro ir fazer compras fora de Almeirim, mas no inverso, pedir fiado aos comerciantes cá da terra, dizer bem dos sogros se estes tinham algum, dar aos afilhados dez escudos pela Páscoa e Natal e dizer que a vida está do pior, ir comer a casa dos compadres porque era mais barato, pendurar o chapéu de chuva nas costas no Inverno quando ia de bicicleta, estrear uma roupinha nova pela Páscoa e Natal e ir à missa ou ao Café e encontrar a mesma roupa em cinco ou seis amigos e perguntar se eles pagaram o mesmo do que ele, ser do União mas nunca ir ver os jogos, deixar de falar à familia e vizinhos por “dá cá esta palha”, mandar o filho p´rá barraca ou palheiro onde estava a mula quando estava bêbado e dizer que a mula era mais esperta que a mulher, ir para a política com o patrocínio dos amigos e depois esquecê-los, etc.. Um bom Almeirinense era e é assim!
Mas quando chegava à Quinta-feira da Espiga, bem… O lugar mais aprazível e sossegado visto esperar ter que dar o Espigão, era sobejamente os mais tradicionais e escolhidos a dedo isto quando se ia com a namorada ou uma amiga.
A Mina, o campo do Sobral, a Vala (como dizia o Malato), muita gente foi lá feliz e quem sabe… feita!
De manhã era hábito o tradicional passeio a pé para ver o local mais agradável ou mesmo já equipados com o farnel, de carroça, muitos já iam para o Tejo.
Durante alguns anos as idas para estes lugares convencionais deram expressão ao simbólico acordeon, para umas “bailações”, mas muitos anos atrás, a gaita de beiços fazia as delícias das mais tradicionais modas, isto quando se juntavam muitos familiares e não só.
As conversas naquele dia debaixo de um sobreiro ou mesmo de um salgueiro não tinham mais do que no dia a dia se traduziam em dizer mal das vizinhas ou mesmo dos familiares. Os homens, estes com o garrafão já meio despejado, davam uma sorna, enquanto os cachopos faziam o mesmo ou andavam aos ganbuzinos.
Nesse dia até a mula ou macho se admiravam – ”Não tinham trabalhado”. Mas ao chegar a casa pelo por do sol, lá tinham que fechar os olhos com um bocado de saca e juntamente com os alcatruzes, fazer parelha e puxar água para regar a horta.
Apesar de ser uma tradição e que está a cair em desuso, ainda hoje os mais velhos, mesmo rente à tarde, juntamente com alguma família, procuram apanhar um “ramo” que virá trazer em mitologia, a riqueza de que nunca falte o pão, o azeite e o vinho à sua mesa durante o ano.
Já agora, nesta próxima Quinta-feira, porque não ir para o Campo, em vez de ir para os Centros Comerciais, Praias ou a ficar em casa na sorna, ir apanhar ar fresco, fazer um pic-nic, levar uma manta, pinga, uma coisa que hoje se come muito raramente “um franguito assado na brasa”, ver se apanha algum casal escondido e ver como se faz o teste da “espiga” com formigas e tudo!
Crónica por Augusto Gil